Ordenança das Pedras
A terra onde nasci não tem mais,
assentaram nela tanta coisa esgotada, que ela foi sumindo, entrando numa buraco escuro, onde até as flores se refugiaram em outras terras empanadas. Minha terra não tem mais: foi pedra em cima de pedra, e, dai, nasceram prédios e mais prédios, -edifícios cintilados de solidão - que foi, pouco a pouco tomado por gente de terno passado, e mulher com roupa de homem, todos falando em celulares, e roda daqui, roda dali, os problemas aumentando, a terra foi crescendo e minha memória foi morrendo. Mas não foi aqui que eu sentava quando me barbeava aos quinze anos? Namorava na terra crescida? No apogeu da terra dourada,batida, crescida de esperança? Minhas ruas foram trocadas de charretes e carros de bois por vistosos carros, - destes bem modernos. Terra de Sienas ! E até a cor da cidade não se dá bem com a cor do céu: amarelo e vermelho, tudo frouxo. Ah! Terra Esgotada! Fui também na antiga casa dela. Era pequena e tinha um riacho a percorrê-la, um jardim a moldá-la, tinha cheiro de mulher, cheiro de terra. Fui na casa dela não chorei, porque a idade já não me provém deste escândalo interior: mas lá estava: a casa dela, onde a gente repartia o dom da mocidade entre beijos e abraços, tinha virado tudo pedra, também esgotada. Não tinha mais nada: literalmente, eram centenas de pedras magoadas dispersas, no jardim e arrolhando o percurso do já minguado riacho. Terra dos Azáfamas! Até o rei Axum varre minha Etiópia! E de minha terra mais nada sobrou: agora é pedra e mais pedra. E nosso amor vigilante, se tornou morte, ela partiu prá lá, eu fiquei cá só e pensando: pedra que faz pedra torna o coração dos homens de argila mais não mata nosso amor. Pedras! Fizeram da terra aquecida, agora fria e crescida. Tão crescida como um desastre interior! E se não lhe dão nome, dou um: cedras vistas de longe são... Ordenança das Pedras!
José Kappel
Enviado por José Kappel em 08/04/2006
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