José Kappel

Um amor sobrevive a outro amor

Textos

E Me Chamam de Senhor
E agora me chamam de senhor.
O leiteiro, os panetoneiros,
os da esquina,
os de perto,
da dobra da avenida,
os que rastejam em veludo,
e olhe lá - até minha prima.

Me chamam por respeito,
sim senhor!
Chamam lá de senhor,
igual a um débil veleiro!

É senhor prá cá,
senhor prá lá,
digna mansão sem teto:
me rastro assim,
comedido e veraz,
é como me sinto,
quando me chamam
de senhor.

Não fundei igreja,
nem toco solo
em coral,
não sou santo,
e olhe,
pouco falta para
completar o meu cíclo
de todos pecados insanos.

Não sou por falta,
nem por devedura,
só não gosto,
e isso cheira a alfafa,
que me chamem de senhor
em plena primavera
de minhas 50 ardeduras!

As crianças já se acostumaram
a ver o sr. passar e chamam lá:
bom-dia, senhor!

Respondo agrário
no meu pensamento
cinquentenário:
mas sr. não sou!

E mesmo se fosse
não deixaria
tal sufoco passar
incólume,tal louvor!

Mas de nada adiantou
minha indignação suposital
deixar que me chamem
de senhor proposital!

Mas, assim, de levedura
em levedura,
vou deixando as coisas
igual a verdura:
amadurecer ou fenecer,
sei lá -
mas desde que não me chamem
de senhor.

Mas a coisa disparou
- o sr. senta! o sr, levanta!
- o sr. deita! o sr. suporta!
- o sr. é bom, mas cadê
a tal bengala?

E a vida passou,
digo eu com meus três
botões
- e elas são uma gracinha -
Maria, Joana e Sandra
todas elas, mas todas elas,
na hora do afoito doutor tocar
só me dizem - e bem pago -
você...você..vai bem
devagar!
E eu digo: sim senhora,
vou na trincheira do vago
mas elas não me chamam
de senhor
mas de você...bem devagar...

E, eu digo com meus botões
de puro carquejo,
se lá chamam de senhor,
tem hora na vida
que só cabe você,
é ai que elas esquecem o sr.,
e pedem pela graça do amor:
nós só queremos você..
José Kappel
Enviado por José Kappel em 23/04/2006


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