É Só Perguntar
Obrigado por perguntar.
Alguém de boa soada, Lá me pergunta, Mas de onde vêm? Chego mais perto e sussuro afoito - assustado- e digo: obrigado por perguntar. Venho de dois lados, Todos os dois agudados de pontas. Um é lascivo, outro é de paz. Mais um de bom-dia não dá pro outro. De onde venho acabotam ventos sudeste, e boroam sóis à bombordo. E me pergunta, De onde vêm? Do cabo mais próximo, do vento mais passageiro. Venho logo do próximo, da primeira esquina, da multidão, da fantasia do avô do meio-amor, do pai. Não venho da mãe, nem da pedra, não venho do roçado, e pinguelo anseios de sal. De onde venho , têm vários lados que fazem dois. Sou uma espécie de rascunho. Isso - rascunho! Cheio de figuras que até hoje não sei tal significado. E são figuras estáveis e comportados. Juvenis e cheio de porta-retratos. De onde venho Vêm o homem sem lei, vem o cavalo sem dono, boitam pradarias e árvores gigantescas. Venho disso tudo, um pouco daqui, um pouco de lá. Medroso feito vara verde, herói de quadrinhos, Mocinho só de cinema, Mulher só de vista. Venho de um pouco de tudo e de um pouco de nada. Mistura exótica e feliz. Venho do pó - porque dizem que de onde a gente vem já vai. Pobre pó! Não sabe o peso que carrega! Venho da quarentena dos homens, da avidez das mulheres e da placidez das criança. Por isto, acomodado, digo sensitivo, tenho vontade de chorar, mas falta coragem. Quisera ser John Wayne para dar tantos tiros, Quisera ser Joyce para refazer a beleza. E por isso sou ambivalente. Um pouco covarde. Herói? - Só bem bêbado de vinho-tonel! E quando ela me acarecia e pergunta de onde vêm eu digo: ora, eu mal sei chegar. Se pousei - foi trazido e forçado,ferido,embatado. Já perdi cem amigos Todos eles chegados agora a uma boa eternidade. Mas não sou omisso! Denuncio o rico e empobreço o miserável. Mas sou bom de coração. Veloz e ágil, sei correr feito águia esbaforida, de tantos anseios. Quem és tu? Tu sou eu, raspa em você, é sua sombra, seu perdiz, sua alcova, seu medo, suas crianças que só dão tiro de pólvora seca e guardam os canhões para derrubar os castelos de marfim. Quem sou eu? Sou criança suave, mulher de duas vozes, homem de montanhas de palavras. E se agora fujo do sol é porque existem alvas montanhas em luto para me guardar. Mas ainda não sou de todo pois faltam reinados, Não sou rainha pois falta seda, Não sou crianca porque tenho voz grossa, nem homem porque velho não é homem nem homem é velho. E se quiser saber mais faça como aquele rei de duas coroas: pegue a vela mais próxima: Se apagar sou eu senão, é tudo pura sombra, árdua bobagem!
José Kappel
Enviado por José Kappel em 05/09/2006
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