Água de Torção
Sou justo,cristalino,inclinado,
perfaço a água, como infusão, de um brado de amor; sou aquoso,oxidante, perfurador de ânsias, barítono de uma grandeza que me fez,um dia, rei dos feéricos. Rústico, de qualidade suspeita, até precária, rodo mundo como um riacho sem precdentes: nada me aguarda, as portas estão fechadas, sou piracema lustroso e caminhante rodeado de sal. Axés! Rodo à volta, e nela goteja louro-cerejas que formam frutos, que,algum dia, será água de rosas mas sem face, com presença falida, em minha borda mortuária. E rodo mundo sem cordas, e enfrento lagos,fontes, bradeado de chuva. Até vento de ordem! Sem valor,mais zeloso, rodo por dutos seculares, destilado,meteórico, de tamanho fácil e cheio de dores vacilantes. Se somos dois, somos parte de água, lustral das flores e musgos, percorrentes da vida e da morte - lá onde cai o sol e levanta a lua. Se somos dois, somos partes, e dentro de amores, a gente jura, sem querer, o que hoje é dormente amanhã será diferente. Nas águas panadas levamos o sabor amargo da despedida. Mas, sem cores aladas. Um dia você se foi avoada, como rolam águas, sem jeito de partir. Um dia você se foi como coisa do passado. E teve gente que disse: lá vai ele: carregado de intrigas e pouco perdão. Lá vai ele - diziam - O homem que veio da noite, disfarçado e descobriu o fogo,a pedra e a água. Mas, desvendado de carinho, foi morrer entre os reluzentes marinheiros de alguma praia sem nome e perdida. Lá na fervura, onde aquecem o gosto do amor-mar, de cerejas e espinhos, e dormindo, pra sempre, ao lado de uma definhante água-marinha.
José Kappel
Enviado por José Kappel em 11/09/2006
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